A língua sarda é uma língua românica que se desenvolveu de uma forma peculiar por estar em uma ilha isolada do continente, a Sardenha, na Itália. Durante o domínio romano a ilha foi usada como lugar de encarceramento para criminosos reincidentes, passando a formar parte do Império Bizantino posteriormente, para em seguida cair sob domínio muçulmano até ser conquistada pela Coroa de Aragão, razão pela qual até os dias de hoje há um enclave de idioma catalão no porto de Alghero. No século XVIII a ilha se integrou à Itália.
O domínio espanhol durou na Sardenha quase quatro séculos (1327 a 1720); os conquistadores da Sardenha foram aragoneses e levaram à ilha o catalão, mas ao lado desta língua foi introduzido o castelhano, especialmente nos centros de Sassarese e Gallura. Até 1764, o espanhol foi a língua oficial da justiça e das escolas. Muitos autores sardos escreveram em espanhol e catalão. É natural, então, que o espanhol e o catalão deixassem na Sardenha sequelas maiores do que em qualquer outra parte da Itália, dominadas menos tempo e menos intensamente pelos espanhóis.
Antes da dominação romana se falava na ilha uma língua ou línguas que são denominadas pelo termo paleosardo, do qual há evidências em um número de palavras que têm elementos comuns com o basco e com o ibérico, enquanto outras estão relacionadas com línguas bérberes.
Os primeiros textos são do século XI, se bem que a falta de obras literárias de qualidade, a visível diferenciação dialetal, e a subordinação das variedades linguísticas sardas às diferentes línguas dos invasores estrangeiros explicam o fato de nunca ter existido uma língua padrão. Não obstante, a Sardenha é o lugar de maior abundância em textos antigos em língua vulgar, no que se refere à Itália. Talvez a razão se deva ao fato da ilha ter tido pouco contato com o latim e muito menos com o grego, de forma que a maioria dos documentos oficiais, para serem entendidos, deviam ser redigidos em sardo.
Página de um antigo Estatuto Sassaresi, datado do século XIV |
”In nomine Domini amen. Ego iudice Mariano de Lacon fazo ista carta ad onore de omnes homiones de Pisas pro xu toloneu ci mi pecterunt: e ego donolislu pro ca lis so ego amicu caru e itsos a mimi; ci nullu imperatore ci lu aet potestare istu locu de non (n)apat comiatu de leearelis toloneu in placitu: de non occidere pisanu ingratis: e ccausa ipsoro ci lis aem leuare ingratis, de facerlis iustitia imperatore ci nce aet exere intu locu. E ccando mi petterum su toloneu, ligatorios ci mi mandarum homines ammicos meos de Pisas, fuit Falceri e Azulinu e Manifridi, ed ego fecindelis carta pro honore de xu piscopu Gelardu e Ocu Biscomte e de omnes ammicos meos de Pisas; Guido de Uabilonia e ILeo su frate, Repaldinu e Gelardu, e Iannellu, e Ualduini, e Bernbardu de Conizo, Francardu e Dodimundu e Brunu e rRannuzu, Euernardu de Garlictu e tTotnulu, pro siant in onore mea ed in aiutoriu de xu locu meu. Custu placitu lis feci per sacramentu ego e domnicellu Petru de Serra, e Gonstantine de Azzem e Uoso Ueccesu e Dorgotori de Ussam e nNiscoli su frate (en)Niscoli de Zor(ie) Mariane de Ussam…”
A língua conta com cerca de 1,6 milhões de falantes, o equivalente a 70% da população da ilha. Em 1989, 31,6% de seus habitantes usavam apenas o italiano no meio familiar enquanto 54, 4% utilizavam exclusivamente ou principalmente o italiano fora da família.
O sardo se subdivide em quatro variantes principais:
§ Logudorês, falado no centro da ilha, na região de Logudoro. Subdivide-se em três subdialetos: meridional ou nuoresa, central e setentrional.
§ Campidanês, na região meridional da ilha.
§ Galurês, na parte nordeste da ilha (Gallura).
§ Sassarês, na cidade de Sassari e arredores.
Nem todos os dialetos falados na ilha são classificados como sardos pois possivelmente o galurês sejam mais corsos que sardos. Talvez tenham sido levados para a Sardenha por refugiados corsos fugidos das prisões corsas.
Possivelmente o dialeto protótipo da língua seja o logudorês, porque o campidanês está mais associado ao italiano. Não há uma norma aglutinante que seja capaz de unificar o desenvolvimento da língua, que por outro lado também não possui um status oficial.
A Sardenha esteve um século dominada pelos vândalos (455-534) e apenas um ano sob o domínio ostrogodo (552-553), e ao que parece estes contatos não chegaram a influenciar a língua; quase todos os poucos elementos germânicos do sardo foram passados pelo italiano ou procedem do latim vulgar.
As palavras árabes, não muito numerosas, chegaram quase todas através do espanhol e do catalão, ainda que exista um ou outro elemento árabe direto na parte meridional da ilha. Mais importantes são os elementos gregos, se bem que algumas palavras greco-bizantinas podem assim mesmo ter chegado através do latim. Mas sem dúvida são os elementos espanhóis e catalães os que mais influíram sobre o sardo.
Às vezes elementos catalães e espanhóis se sobrepuseram a palavras sardas que desapareceram por completo ou apenas se conservaram nas regiões montanhosas do interior; por exemplo, em toda ilha se encontra o hispanismo ventana, “janela”, e só nos dialetos mais conservadores, como o de Gennargentu, usa-se fronesta ou fenestra. As febres (sobretudo palustres) são designadas no campo pela palavra kalentura (do espanhol calentura), mas o logudorês e os dialetos de Gennargentu conservam derivações do latim febre(m) - freba. Os vocábulos ibéricos (catalães e espanhóis) abundam especialmente na terminologia da administração e da Igreja, por exemplo: sa séu, “a catedral”, em catalão séu, proveniente do latim sede(m); tróna, “púlpito”, em catalão trona. É também catalã, ao menos em grande parte, a terminologia da pesca. É também notável sobre o sardo a influência do italiano, sempre crescente, sobretudo nos centros urbanos.
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